Jornalismo, para ser marrom, tem que ser pelo menos jornalismo
Jornalismo, para ser marrom, tem que ser pelo menos jornalismo
Você vai ao médico, ele coloca 40 gotas de dipirona pra criança, mas diz que são 10 (até aqui, tudo o que foi explicado pela “imprensa”).
A paciente sabe disso, está bem atendida e, inclusive, elogia o médico.
Uma outra médica, como se não tivesse nada pra fazer, vê que o médico é… cubano. E decide “denunciar” o colega. Um erro do idiota do médico cubano que poderia ter matado um pequeno brasileirinho. A Globo na Bahia compra a mentira e vai fundo: https://glo.bo/I60G2n
Uma comissão ouviu a mãe, diarista, que disse: eu entendi tudo, está tudo OK, aliás o médico é ótimo.
A comissão ouviu o médico: ele confirmou que a dose deveria ser fracionada em quatro vezes. “Não estou vendo problema na prescrição fracionada porque o raciocino clínico foi correto”, afirma a comissão.
O médico, concluíram, não errou e ninguém poderia, portanto, em hipótese alguma, se prejudicar — pelo contrário, diz a mãe: “Ele me atendeu muito bem. Ele tratou meu filho super bem, porque tem médico que nem olha na cara da mãe e nem da criança. Ele me explicou direitinho como dar o remédio, disse ainda que a quantidade de gotas é definida a partir do peso da criança”.
Dois jornais locais, que não saíram no G1, deram a versão correta: https://glo.bo/I8ITaW e https://bit.ly/I8IVQg
Aí vem o G1 e apresenta a mesma informação, que deveria ser no mínimo uma retratação, da seguinte forma — “Médico cubano suspeito de receitar dose excessiva voltará a atender”: https://glo.bo/I8J8mj
O detalhe sórdido: a primeira manchete deste link acima, pasmem, foi “Médico cubano que receitou dose excessiva volta a atender na segunda”. (O caminho da URL permanece “medico-cubano-que-receitou-dose-excessiva-volta-atender-na-segunda.html”, denunciando a mudança)
É simplesmente inacreditável. Jornalismo, para ser marrom, tem que ser pelo menos jornalismo — o que não é o caso.
Até onde, pergunto, vai a estupidez de uma elite que não quer, a todo custo, melhorar a vida da população que mais precisa de serviços médicos? Que lógica um “jornalista” (o editor) — a não ser a má-fé não declarada — usa para tornar isto uma notícia?
Com a palavra, a diarista, a mãe: “Ela não teve ética. Fez algo que não autorizei. O médico me explicou certo. Eles estão com raiva porque os cubanos estão fazendo o trabalho que eles não querem fazer. Os médicos brasileiros tratam a gente como se fôssemos animais, diferente dos cubanos”.
O jornal local A Tarde registra:
“A notícia do afastamento do médico levou inúmeros moradores do conjunto Viveiros para a Unidade de Saúde para reclamar da atitude da secretária e solicitar o retorno imediato do profissional que, segundo eles, era atencioso e tratava todos com respeito.
Cristiane Araújo Fonseca fiz que levou o filho de 4 anos na quarta-feira para a unidade com febre, vômito e diarréia e que o médico fez todos os exames e o medicou. “Meu filho melhorou logo graças ao médico. Queremos o médico de volta, passamos mais de 2 meses sem médico e agora inventam coisa para tirar o médico daqui”, afirmou.
Os moradores afirmaram que, caso o médico não retorne para a unidade, eles farão uma manifestação fechando a entrada da unidade. “Se não retornar na próxima semana, iremos impedir o funcionamento do posto de saúde. A secretaria deveria ouvir a comunidade e não acreditar em uma mentira”, ameaçou Maria da Glória Martins.”